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Entenda o que é a fitotoxidade e os seus efeitos na cultura da soja

Que a soja precisa de nitrogênio, isso todo mundo sabe. O desafio é saber qual a quantidade ideal e também quais fatores podem prejudicar a presença adequada deste elemento nas plantas. Para entender esta questão, precisamos falar da fitotoxidade, a capacidade que agentes externos possuem de interferir no metabolismo das plantas, podendo até mesmo reduzir a produtividade.

O nitrogênio é um dos nutrientes mais demandados pela soja, que necessita de aproximadamente 80kg de N para cada tonelada de grãos produzidos. Se fosse necessário aportar todo esse volume via fertilizante químico a produção ficaria muito cara, quase inviável. Ainda bem que um aporte deste tamanho não é imprescindível graças à simbiose de bactérias com as leguminosas, capaz de fornecer o nitrogênio necessário à planta.

É aí que entra um dos segredos da saúde das plantas e, consequentemente, da melhor produtividade, a chamada Fixação Biológica de Nitrogênio (FBN). Trata-se de um processo natural que ocorre em associações de plantas com bactérias diazotróficas. Pela FBN, o nitrogênio é capturado do ar e fixado por estas bactérias, encontradas em muitos tipos de solos. É uma verdadeira "fábrica biológica”, capaz de suprir as necessidades de várias leguminosas, como por exemplo, a soja.

Mas o nosso assunto não era fitotoxidade? Com certeza, agora vai ficar mais fácil entender. É que pesquisas recentes vêm avaliando o efeito de herbicidas como o glifosato na fixação do nitrogênio – e alguns estudos indicam que pode haver danos à produtividade, que precisam ser minimizados. Um exemplo disso é uma pesquisa publicada em 2009 pelo pesquisador Henrique Saes Zobiole, da Universidade Estadual de Maringá (UEM), em conjunto com outros cientistas. Eles observaram o comportamento da soja transgênica e não transgênica no que se refere ao impacto da aplicação do glifosato na concentração de nutrientes minerais. Um dos resultados foi que, em cultivares de ciclo médio, houve redução na quantidade de elementos como nitrogênio, zinco e manganês. A pesquisa também revelou que houve redução na biomassa das plantas de soja, na parte aérea e na raiz das cultivares que receberam aplicação de glifosato, na comparação com as demais.

O glifosato é amplamente utilizado na agricultura mundial e é fundamental para os produtores rurais no Brasil. O avanço do uso do herbicida ocorreu com a chegada da soja transgênica RR, que é resistente a este princípio ativo. A tecnologia proporcionou ganhos de produtividade em relação à soja convencional, passando a controlar de forma mais eficaz a presença de plantas daninhas. Mas nem tudo é perfeito. Ao longo dos anos, algumas pesquisas também constataram prejuízos diretos ou indiretos para a soja. O efeito nocivo ocorre da seguinte forma: o glifosato, quando aplicado na soja RR, pode causar injúrias e prejudicar a simbiose com o rizóbio devido a intolerância das bactérias diazotróficas ao ingrediente ativo. Em situações no campo, é possível observar uma clorose característica, causado pela presença do AMPA, um composto prejudicial às plantas proveniente da aplicação do herbicida, sendo esse um dos encarregados pela redução do crescimento vegetativo e da concentração de clorofila.

A professora da Faculdades Associadas de Uberaba (Fazu), Soraya Marx Bamberg, explica que a nodulação da soja pode ser afetada pelo glifosato. Segundo ela, as pesquisas disponíveis indicam que o glifosato atua por meio da inibição da enzima EPSPs na rota do ácido chiquímico e na síntese de aminoácidos essenciais às plantas: fenilalanina, tirosina e triptofano. Seria algo prejudicial a FBN, pois as bactérias simbióticas apresentam a enzima EPSPs suscetível, ao contrário da soja transgênica.

O stress nas plantas de soja RR, causado pela diminuição dos teores de clorofila e da massa seca dos nódulos, além da redução da taxa de FBN quando receberam aplicação do herbicida, também foram observados pelo pesquisador Henrique Zobiole, em artigo publicado em 2011.

Um trabalho divulgado em 2012, pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) também pondera que o herbicida pode causar a redução do teor de níquel, micronutriente essencial para as bactérias simbióticas da FBN. Desta forma, com a redução da fixação biológica de nitrogênio, haveria prejuízos metabólicos, de crescimento e de produtividade. O mesmo estudo afirma que a aplicação do glifosato em soja RR pode reduzir de 21 a 28% a massa fresca de nódulos na soja.

O assunto ainda causa controvérsias. A pesquisadora da Embrapa Soja, de Londrina-PR, Mariangela Hungria, participou de estudos que avaliaram os impactos da soja transgênica e do glifosato em diversos parâmetros importantes para a produtividade, entre eles a fixação biológica de nitrogênio (FBN), com experimentos em campo. "Nossa conclusão é que não houve efeito direto do glifosato neste processo”, afirmou a pesquisadora. Segundo ela, os estudos concluíram que as diferenças verificadas nos níveis de FBN estavam relacionadas ao local, período de cultivo e também às variedades utilizadas.

Um outro efeito que vem sendo atribuído a esta fitotoxidade do glifosato é a menor concentração de clorofila, em função de alterações na taxa fotossintética. Mariangela Hungria também descarta esta relação direta com o herbicida, em função dos estudos publicados pela Embrapa. Já alguns trabalhos acadêmicos de universidades brasileiras vêm tratando do amarelecimento foliar denominado “Yellow Flashing” e muitos produtores passaram a usar o manganês junto com o glifosato, na tentativa de minimizar estes efeitos. Diversos especialistas, no entanto, vêm afirmando que esta aplicação de manganês não auxilia de forma efetiva no abrandamento dos danos promovidos pelo herbicida.

Mas então, qual a solução para o problema? Se a bactéria que está nas raízes não é resistente ao glifosato, o caminho pode ser o fortalecimento. Produtos que possam fortalecer o processo de nodulação, responsável pela absorção do nitrogênio, podem ser a saída. Mas este é um assunto que vamos falar em outro post. Continue ligado no blog da Satis.